Matéria publicada no Jornal cametaense TOMAGICA, publicação Agosto/Setembro 2007, página 08 sob a responsabilidade da Professora Lucilena (Cica), mestra em Estudos Literários pela Universidade Federal do Pará
Ele ocupa a cadeira 33 da Academia Paraense de Letras. Em 1972, lançou seu primeiro livro de poemas intitulado “Cânticos do Amor Amado”, de lá para cá não parou mais de escrever, são mais de trinta obras publicadas e outras aguardando publicação. É um dos escritores contemporâneos mais celebrados da Amazônia. Sua missão é divulgar a cultura da região. Não bastasse isso tudo, para melhorar ainda mais, é orgulhosamente cametaense. Quem é ele? Salomão Larêdo, óbvio!!!
1. O fato de ser filho de Cametá, Cidade Patrimônio Histórico Nacional, berço de tanta cultura, estimula a produção de suas obras?
R – Orgulho-me de ser do sitio e ter nascido na inesquecível Vila do Carmo, município de Cametá, na ilharga de Mocajuba, na casa que me fez encarar de frente , nem bem escapuli do útero de minha mãe Lady às quatro da madrugada do dia 23 de abril para as alegrias de meu pai Milton sob as mãos da competente parteira Raimunda Filgueiras, o rio Tocantins, o rio mais bonito do mundo onde pude espelhar-me ao ser lavado no pós-parto em suas águas doces perfumadas pelas ervas, essências e folhagens, da catinga de mulata, da mataria rodeante , águas que estavam na maré enchente de uma sexta-feira de minha oferta/oferenda, e encantar-me com as encantarias da mãe d’água do fundo do rio, com seus palácios nas cidades comunitárias do perau, levado pela boiúna na montaria do boto, proseando com Caninana e seu irmão Norato ensinando pajelanças e trafegando livremente com todos os encantados. Sou inerente e imanente desta região e então, como não falar dela? Como não ser estimulado a produzir textos que contem, cantem e contenham suas maravilhosas maravilhas culturais da minha gente? Nasci com esse fado e por isso também sou matintaperera.
2. Nossa região é rica em narrativas orais, entretanto, poucos escritores se debruçam sobre essa modalidade e quase não bebem na nossa fonte, o que não é o seu caso. Qual sua perspectiva em relação a manutenção do imaginário amazônico?
R - Até aqui minha obra se embrulha no lençol do lendário e do imaginário da Amazônia, especialmente o do Baixo-Tocantins, sublinhando Cametá; está impregnada do cotidiano popular, prenha das manifestações da religiosidade popular que tem uma súplica sincera, da cultura dos simples que produzem tanta riqueza e dela não se beneficiam. Por mais que incansavelmente trabalhe, não esgotarei a fonte e meu texto continuará a mantença do que você se refere. Contudo, a pergunta persiste e tenho que dizer, cara professora Lucilena, que as manifestações culturais contemporaneamente tem uma relação meio complicada - há muita resistência - com o que atualmente a dinâmica social cognomina globalização que subtrai do caboclo o direito de fruir o que é seu e usufruir de direitos aos equipamentos básicos de que precisa para viver com dignidade. As culturas regionais são frágeis diante das culturas de massa propagandeadas pela mídia globalizada.
O atual sistema procura impor culturas artificiais para homogeneíza-las em toda parte em detrimento e desprezo às culturais locais apostando na indiferença ao outro, sem laços familiares, comunitários, culturais, destruindo o que é mais bonito na vida que é a relação humana que existe nos processos de construção cultural que sempre brotou da inter-relação pessoal e coletiva para que tudo isso gere desconfiança, desamor e fragilize as relações até destroçar qualquer tipo de identidade que possa unir, servir de vínculo na construção da harmonia característica de nossa gente na convivência fraterna que nos fez e faz povo, comunidade de afeto, notadamente no município de Cametá .
Nossa memória cultural precisa ser conservada homológica e pragmaticamente através das manifestações da cultura espontânea, até para ser fruída por todos, patrimônio imaterial que coloca em movimento expressões públicas que contribuem com a nossa identidade sócio-cultural nessa batalha pela democracia cidadã. A perspectiva filosófica, é boa. A perspectiva política, é assim, como disse, complicada, precisamos trabalhar mais para que não apaguem nossa memória e por isso produzo as minhas pesquisas em literatura popular que me habilitam ao olhar semiótico amazônicolatinoamericano no trânsito de signos visuais, de símbolos que se transformam em personagens que saltam do meu texto conforme também o modelo gramsciano que contempla também Bakhtin, Bod Dylan, Caetano Veloso, Cupijó, Beatles, Wittgenstein, Guitarradas, Bobbio, Sartre, Habermas, Roberto Schwarz, Santiago, Roberto Da Mata, Walter Benjamin, Hegel, Vicente Salles, Foucault, Leonardo Boff, José Comblin, Barthes, Bachelard, Umberto Eco, Max Weber, Mário de Andrade, Engels, Goethe, Cortázar, Galeano, Martin Heidegger, Unamuno, Derrida, Platão, Friedrich Nietzsche, Hanna Arendt, Milton Santos e tantos outros nessa constante e necessária comunhão intelectual-ideológica.
Por isso atuo com meu texto - baseado nas oitivas do povo, no imaginário popular - em todas as frentes de combate sócio-político-cultural. Assim continua meu fado de matintaperera, batalhando pelo bem comum, pois a cultura de massa ou indústria cultural procura proceder mudanças culturais pela avidez de mercado que deseja nos descontrolar para que possamos cada vez mais ser consumidores de bens matérias que alimentam um grupo reduzido dos que têm tudo e controlam tudo pelo poderio econômico
, ficando imensa maioria com o mínimo pra sobreviver, resultando daí, o desemprego dos que não tendo instrução saem do seu lugar e avançam para as cidades em busca do que não existe e são vítimas da globalização, fenômeno complexo a agir em todas as dimensões, promovendo iniqüidades e injustiças
Se nos descuidarmos, a globalização, ávida por lucro, chega e destrói tudo que temos e ficamos sem identidade, sem rumo e aí fatalmente perderemos, em nossa região Amazônica, o que ainda resta de nossas riquezas naturais (madeira, minérios,água, biodiversidade, terras, etc) humanas e culturais das populações locais, causando verdadeiro estrago antropológico, conforme quer o perverso mercado globalizado.
Usando as narrativas orais valorizo o que é do povo fortalecendo a cultura dos simples para que não se desencantem, não percam essa dimensão de sua identidade, aquela que sempre distinguiu nosso humanismo. Salvaremos pelo menos a cultura de resistência nesse embate por uma democracia participativa baseada na promoção e respeito aos direitos humanos e nos valores construídos pela sociedade civil, porque a cultura do consumo quer nos impor um modelo de desenvolvimento com valores muito discutíveis para modificar nosso mundo cultural e vivencial enquanto povos que somos da Amazônia, pois o capitalismo quebra todas as formas de solidariedade porque vê nelas resistências ao seu desenvolvimento e então promove a dissolução da vida social nas comunidades das ilhas e vilas e uma forma de união de nosso povo sempre foi através da festa de santos e encantados - para mencionar aqui os antropólogos Anaiza Vergolino e Napoleão Figueiredo - , da irmandade, da comida, costume de beijar fita das imagens de santo, dança, cantiga, beberagem ou seja, da cultura e do modo de falar com sotaque diferente que o sistema quer calar porque a língua é nossa principal identidade.
Desculpe ter-me alongado, mas faz-se necessário prestar estes esclarecimentos diante de sua pergunta que certamente decorre do vislumbre de sua atividade de mestra.
3. De onde e como surgiu inspiração para a composição de sua primeira obra “Cânticos do Amor Amado”?
R – Mostrava também meus trabalhos aos colegas do curso clássico do CEPC – colégio estadual Paes de Carvalho - na década de 1970, plena ditadura militar que nos desagregava. São exercícios de expressão poética de quem cultivava a leitura de mestres como Manuel Bandeira, Carlos Drumond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Ferreira Goulart, João de Jesus Paes Loureiro, Bruno de Menezes, José Sampaio de Campos Ribeiro, José Ildone Favacho Soeiro, Sengor, Pablo Neruda, Fernando Pessoa , o poeta espanhol Federico Garcia Lorca, além dos cineastas Píer Paolo Pasolini, Luis Buñuel, Glauber Rocha, Luchino Visconti, Bergman, Godard, Claude Lelouche, gente da mpb como Caetano Veloso, Chico Buarque, Vandré, Jackson do Pandeiro, Luis Gonzaga e muitos outros. Estava iniciando a minha juventude sob a mordaça do regime ditatorial e queria também falar de amor, do muito amor que explodia em mim e precisava espocar para ser compartilhado e maturado para as investidas fenomenológicas.
4. Em Antônia Cudefacho a protagonista é uma mulher “pública”, mas a cima de tudo poderosa, de personalidade marcante, cuja paixão por um padre a leva aos extremos. É uma encíclica socialmente brasileira ou tem muito da peculiaridade cametaense?
R- Denominei de encíclica cametaense e por isso, “ socialmente brasileira” como você diz e expliquei o porque nas primeiras páginas do romance. Sou muito cioso, cuidadoso e respeito muito a inteligência do leitor. Aqui é também o universo, não preciso ir a Londres. Canto daqui deste “ chão cametaense” como dizia o nosso saudoso escritor conterrâneo Victor Tamer, para o mundo. Claro que a peculiaridade é cametauara, é isso uma levada que procuro registrar de forma indelével nas mentes, para que possamos pensar nossas qualidades de caboclo, nossa pujança, nosso modo especial de ser, de amar, de falar, de ser afetuoso com o outro, de ser solidário. Essa é uma peculiaridade muito especial do “ maparauara” como diz o Dmitrius Braga. Quero esclarecer que na pesquisa que fiz na cidade de Cametá, constatei que o amor entre os dois, era recíproco, cheio de visgo.
5. Em algumas de suas obras, (como em Sibele Mendes de Amor e Luta; Vera; Lâmina Mea; Antônia Cudefacho...) o senhor se mostrou um profundo conhecedor da condição feminina. Isso é mais uma preocupação especial do seu estilo literário?
R - Não sou conhecedor, procuro ser um atento e aplicado estudioso da alma humana, sobretudo da alma feminina de quem gosto muito. Aqui, o feminino é Amazônia, as amazonas, na estética amorosa que legitima as cametauaras e parauaras em geral nessa bela composição de fêmeas famintas de sensações e emoções lecionadas na magia da natureza, beleza infinda exposto no corpo ardendo regrada em ciclos inhacosos atraentes que se rebelam por cabanagens penugens dos cabanos entre noviscas heroínas de uma situação opressora carente de devaneio e libertação. Corpo e ânima que se animam na fisionomia política do agressor/opressor, memória ingrata de filhamento sem paternidade que o boto assume com a ternura e afagos de que gostam e sabemos compartilhar na fortitude peculiar delas que o sistema quis incutir como fragilidade. Mulher é amor e poesia, então, poemas de amor para as mulheres, sempre !
6. O senhor publica mais narrativas do que poemas, essa predileção pelo contar tem a ver com o gosto povo amazônico?
R – Não sei se tem a ver com o gosto do povo amazônico, não me dediquei a meditar esse detalhe que você acentua, sem dúvida, importante para ser analisado. O poema é sempre mais difícil de ser elaborado. Posso te dizer que gosto quando faço prosa-poética. Paulo Nunes me disse certa vez que sou melhor na poesia. É generosidade do colega e amigo escritor. Contudo, é bom esclarecer que meus livros não encalham nas estantes, tenho uma boa conexão com o público leitor a quem estou sempre atento aos seus anseios de leitura literária sem perder a minha liberdade criativa de escrever o que quiser, quando desejar, com o cuidado de não liberar o texto como um autômato ao mero sabor do impulso da inspiração.É preciso obedecer certos regramentos e não descuidar-se da técnica que se aprende lendo as grandes obras dos grandes mestres para o devido aprimoramento, afinal, escrever é uma arte, a arte literária e não mero diletantismo.
7. Qual das suas obras é a sua preferida? Existe aquela que o senhor contempla com mais carinho, e que se pode dizer que é a síntese de Cametá?
R – Não sei se algum desses livros serve como a síntese literária de Cametá. Sei que em todos está a minha essência, a raiz cametaense.
Gosto da bravura cabana da Sibele no “Sibele Mendes de amor e luta”, o primeiro romance publicado; fico comovido com que expressa ternamente a nossa humanidade cabocla a personagem Izabella no romance “Remos de Faia”, gratifica-me ter tido a oportunidade de expor em prosa poética a grandeza, a beleza e a sensualidade da mulher cametaense através da pedagogia do desejo manifestada no rastro de sedução sobretudo pelo farfalhar da palavra odorizada de inhacas atrativas que é marca registrada nossa, queiram ou não, no romance “Antonia Cudefacho” ; aprecio a densidade das personagens femininas que freqüentam os contos de “Marailhas”. Falaria de cada livro (qual de um filho) com muito afeto. Mas, para ser objetivo com sua pergunta, presentemente, tenho muita afeição ao texto que produzi no livro “Matintresh”, é uma proposta de nova estrutura narrativa que está ligada à mundiação e que se arreganha já na orelha da obra para a análise do leitorado e que se aproxima ao que estou quase chegando, que é o hiper-romance que se constrói por meio de um núcleo comum com muitas histórias que se entrecruzam, é um pouco aquilo de que faz apologia como grande rede o escritor italiano que nasceu em Cuba,Ítalo Calvino em sua obra “ Seis propostas para o próximo milênio” , ao tracejar teorias acerca do romance contemporâneo. Vamos ver como se sai essa minha performance quando publicar em breve o livro GALO TESO.
8. Infelizmente a Literatura da Amazônia é pouco divulgada nas demais regiões do país e até mesmo em nossa cidade. São raros os escritores que conseguem ser consagrados em vida. O senhor acha que o Cânone Literário Nacional pode ser responsabilizado por isso, uma vez que o norte quase não é lembrado pelas grandes academias?
R- Esse papo é longo e vamos tentar responder por partes. Sim, a literatura aqui produzida não é conhecida nem em Belém onde nos concentramos. Por quê ? Faltam políticas públicas que facilitem o acesso ao livro e ao escritor local. Não valorizamos o que é nosso.
A questão do Cânone é uma dialética desgastante, me parece, porém, faz-se muito necessária o seu debate público, porque ele se esconde, fica entipitizado nas fendas, anteparado nos biombos para observar e influenciar sem ser visto, fica recôndito como costuma se comportar quem quer agir subrepticiamente, claro, prejudicando mais que ajudando.
Meu ponto de vista é que sempre vão existir, infelizmente, grupos que elegem os seus preferidos e aí estão laborando uma espécie de cânone particular que fica grave na medida em que esse mandarinato acaba influenciando nacionalmente e em áreas acadêmicas para que só se trabalhem os que figuram naquele cânone, em detrimento de outros tão bons ou até melhores, que,infelizmente, não caíram, por uma razão ou outra, no gosto do circulo do mandarim que governa todas as ações nesse sentido, não permitindo o ingresso de outros que purgam seus pecados no limbo do esquecimento.
Qual o escritor paraense que figura no dito cânone nacional? José Veríssimo, Inglês de Sousa, Dalcidio Jurandir, Ildefonso Guimarães, Raymundo Moraes, Benedito Nunes? Qual ? Nenhum. É por falta de competência e de qualidade? Não, é puro preconceito, nós não fazemos parte da cultura nacional, nem da local que só se interessa pelo que vem de fora, nós não valorizamos o que é nosso até porque nem sabemos ou conhecemos o que é nosso!
9. Vivemos em uma região afastada dos grandes centros culturais, campeões em consumo de livros, como Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais. Entretanto, nosso estado tem algumas particularidades como a venda de livros não só em livrarias, mas também em farmácias, supermercados, sebos... Ainda assim as pesquisas não nos são favoráveis. O que, em sua opinião, poderia mudar essa realidade?
R – Tenho que repisar o assunto e vamos por partes.
Sabemos que pós-modernamente houve uma expansão também no conceito de cultura e de escola. Escola não é apenas aquele espaço físico convencional. Na verdade, escola no mundo moderno se dá em toda parte porque em qualquer lugar estamos aprendendo. Cultura tem nos dias de hoje uma abrangência imensa e me atenho aqui a uma dimensão dela, chamada cultura letrada, livro que deve ser ofertado à aquisição em toda parte, também nos supermercados, etc. , sobretudo quando não se tem livraria e as temos em tão pouco número no Brasil e em Cametá, podemos contar nos dedos da mão e sobram dedos e quando existem são mais papelarias que livrarias, credite isso também ao capitalismo selvagem que quer você cada vez mais consumidor compulsivo de bens materiais e não de bens culturais e jamais, leitor porque isso implica em consciência crítica e política, em mudança de comportamento, em suma, em liberdade.
Precisamos de políticas públicas que efetivamente contemplem o livro e disso naturalmente decorre a educação e a cultura. Cada gestão de governo tem que investir muito no binômio educação e cultura que passa pela leitura e se dá por meio do livro. Então essa realidade pode e deve ser modificada com a nossa ação concreta, exigindo - através de solicitações, apelos, reivindicações escritas, passeatas -, cobrando dos deputados,vereadores, senadores, dos partidos políticos, dos líderes comunitários, das igrejas, da diocese, dos pais, dos professores , dos governos (em todas as esferas) a adoção de bibliotecas públicas em todos os municípios. É bom que fique claríssimo que quando se fala em biblioteca, está se pensando em local aprazível, com bom atendimento de profissional, no caso bibliotecárias, espaço agradável,limpo, bem arejado, bem iluminado,informatizado, confortável e sobretudo, com bom acervo - inclusive as obras dos autores autóctones e se estimular a presença deles nesses ambientes para que o povo os reconheçam e identifique seus livros - permanentemente atualizado e que funcione 24 horas. Em nosso caso cametaense, que haja bibliotecas em todas as escolas, especialmente as que ficam nas beiras dos rios de nossas ilhas e que o livro, o jornal, a revista tenha espaço de leitura nas casas, rabetas, pu-pu-pus, lanchas,cascos, balsas, ônibus, trapiches, clube de mães, centros comunitários,bancos das praças clubes de futebol, estádios, quadras de esportes, associações, espaços de festas, bares, lanchonetes, banca de cachorro quente, agremiações carnavalescas, de serviços, paróquias, capelas, postos de saúde, hospitais, câmaras municipais, ministério público, fóruns, tribunais, enfim, em todo lugar e toda parte os livros devem ser “ deixados” para que o outro leia e lendo, pense e pensando, modifique as estruturas sociais, trabalhe por justiça social, progresso inclusivo. Na adoção de uma educação leitora e literária na escola, através do livro e da leitura podemos nos tornar cidadãos culturais leitores que analisam seu entorno e podem dialogar com outros em qualquer parte do mundo expressando sua identidade. Não se pode existir sem leitura. Ler é o maior espetáculo da terra !
10. Qual sua receita para se tornar um bom leitor e, consequentemente, um bom escritor?
R - Essa pergunta, diriam os mais experientes, os mais preparados , os mais sábios, os que estão na caminhada da militância há mais tempo: olha, não entra nessa, é uma calça-justa, uma casca de banana,uma armadilha ! Porém, como em literatura, na vida, sou sempre audacioso, corajoso, ousado, atrevido, inquieto, irrequieto, hiperativo, indomável. Arrisco-me sempre ! E ai de mim se não arriscar !
E então, lauvai, parentes Doriedson, Cassique, Danúzio, Mocbel, que estão na minha mutuca. Meu Deus, o que seria um bom leitor e um bom escritor?
Entendo nessa pergunta que você se refere a quem pelo menos já é leitor, certo? E em assim sendo, já estamos a meio caminhado andado e então a receita é a mesma com os medicamentos que vem usando: ler e ler e continuar lendo preferentemente as boas e grandes obras dos grandes e bons autores da literatura universal, ler tudo, tudo e ir pouco a pouco fazendo escolhas, pois é impossível ler tudo no tempo que o ser humano vive neste planeta Terra.
Creio que na seqüência raciocinada do questionamento, a pessoa, pelo menos, já é um escritor e por isso, entendo que para se tornar um “ bom escritor”, a receita também é a mesma prescrita ao “bom leitor”, que, para obter o resultado que espera, deve administrar o remédio em dose redobrada: ler e ler e ler e ler sempre, tudo e evidentemente, escrever e escrever, reescrever, reelaborar, rever, revisar, e depois fazer uma peneirada para separar o joio do trigo, aqui posto simbolicamente. E deixar o tempo fazer sua parte na avaliação. Quem gosta da atividade, quem é dotado deste dom, se habitua a ler e escreve diariamente, é o mínimo que pode fazer para desenvolver sempre mais e multiplicar os talentos recebidos, para habilitar-se ao que se propõe, ser cada vez melhor escritor. O mestre Haroldo Maranhão, paraense de nascimento e grande prosador de nossa literatura receitava: mesmo sob dores, se você é escritor, escreva.
Que tá, parentes, me sai bem? Orra, meu!
Ele ocupa a cadeira 33 da Academia Paraense de Letras. Em 1972, lançou seu primeiro livro de poemas intitulado “Cânticos do Amor Amado”, de lá para cá não parou mais de escrever, são mais de trinta obras publicadas e outras aguardando publicação. É um dos escritores contemporâneos mais celebrados da Amazônia. Sua missão é divulgar a cultura da região. Não bastasse isso tudo, para melhorar ainda mais, é orgulhosamente cametaense. Quem é ele? Salomão Larêdo, óbvio!!!
1. O fato de ser filho de Cametá, Cidade Patrimônio Histórico Nacional, berço de tanta cultura, estimula a produção de suas obras?
R – Orgulho-me de ser do sitio e ter nascido na inesquecível Vila do Carmo, município de Cametá, na ilharga de Mocajuba, na casa que me fez encarar de frente , nem bem escapuli do útero de minha mãe Lady às quatro da madrugada do dia 23 de abril para as alegrias de meu pai Milton sob as mãos da competente parteira Raimunda Filgueiras, o rio Tocantins, o rio mais bonito do mundo onde pude espelhar-me ao ser lavado no pós-parto em suas águas doces perfumadas pelas ervas, essências e folhagens, da catinga de mulata, da mataria rodeante , águas que estavam na maré enchente de uma sexta-feira de minha oferta/oferenda, e encantar-me com as encantarias da mãe d’água do fundo do rio, com seus palácios nas cidades comunitárias do perau, levado pela boiúna na montaria do boto, proseando com Caninana e seu irmão Norato ensinando pajelanças e trafegando livremente com todos os encantados. Sou inerente e imanente desta região e então, como não falar dela? Como não ser estimulado a produzir textos que contem, cantem e contenham suas maravilhosas maravilhas culturais da minha gente? Nasci com esse fado e por isso também sou matintaperera.
2. Nossa região é rica em narrativas orais, entretanto, poucos escritores se debruçam sobre essa modalidade e quase não bebem na nossa fonte, o que não é o seu caso. Qual sua perspectiva em relação a manutenção do imaginário amazônico?
R - Até aqui minha obra se embrulha no lençol do lendário e do imaginário da Amazônia, especialmente o do Baixo-Tocantins, sublinhando Cametá; está impregnada do cotidiano popular, prenha das manifestações da religiosidade popular que tem uma súplica sincera, da cultura dos simples que produzem tanta riqueza e dela não se beneficiam. Por mais que incansavelmente trabalhe, não esgotarei a fonte e meu texto continuará a mantença do que você se refere. Contudo, a pergunta persiste e tenho que dizer, cara professora Lucilena, que as manifestações culturais contemporaneamente tem uma relação meio complicada - há muita resistência - com o que atualmente a dinâmica social cognomina globalização que subtrai do caboclo o direito de fruir o que é seu e usufruir de direitos aos equipamentos básicos de que precisa para viver com dignidade. As culturas regionais são frágeis diante das culturas de massa propagandeadas pela mídia globalizada.
O atual sistema procura impor culturas artificiais para homogeneíza-las em toda parte em detrimento e desprezo às culturais locais apostando na indiferença ao outro, sem laços familiares, comunitários, culturais, destruindo o que é mais bonito na vida que é a relação humana que existe nos processos de construção cultural que sempre brotou da inter-relação pessoal e coletiva para que tudo isso gere desconfiança, desamor e fragilize as relações até destroçar qualquer tipo de identidade que possa unir, servir de vínculo na construção da harmonia característica de nossa gente na convivência fraterna que nos fez e faz povo, comunidade de afeto, notadamente no município de Cametá .
Nossa memória cultural precisa ser conservada homológica e pragmaticamente através das manifestações da cultura espontânea, até para ser fruída por todos, patrimônio imaterial que coloca em movimento expressões públicas que contribuem com a nossa identidade sócio-cultural nessa batalha pela democracia cidadã. A perspectiva filosófica, é boa. A perspectiva política, é assim, como disse, complicada, precisamos trabalhar mais para que não apaguem nossa memória e por isso produzo as minhas pesquisas em literatura popular que me habilitam ao olhar semiótico amazônicolatinoamericano no trânsito de signos visuais, de símbolos que se transformam em personagens que saltam do meu texto conforme também o modelo gramsciano que contempla também Bakhtin, Bod Dylan, Caetano Veloso, Cupijó, Beatles, Wittgenstein, Guitarradas, Bobbio, Sartre, Habermas, Roberto Schwarz, Santiago, Roberto Da Mata, Walter Benjamin, Hegel, Vicente Salles, Foucault, Leonardo Boff, José Comblin, Barthes, Bachelard, Umberto Eco, Max Weber, Mário de Andrade, Engels, Goethe, Cortázar, Galeano, Martin Heidegger, Unamuno, Derrida, Platão, Friedrich Nietzsche, Hanna Arendt, Milton Santos e tantos outros nessa constante e necessária comunhão intelectual-ideológica.
Por isso atuo com meu texto - baseado nas oitivas do povo, no imaginário popular - em todas as frentes de combate sócio-político-cultural. Assim continua meu fado de matintaperera, batalhando pelo bem comum, pois a cultura de massa ou indústria cultural procura proceder mudanças culturais pela avidez de mercado que deseja nos descontrolar para que possamos cada vez mais ser consumidores de bens matérias que alimentam um grupo reduzido dos que têm tudo e controlam tudo pelo poderio econômico
, ficando imensa maioria com o mínimo pra sobreviver, resultando daí, o desemprego dos que não tendo instrução saem do seu lugar e avançam para as cidades em busca do que não existe e são vítimas da globalização, fenômeno complexo a agir em todas as dimensões, promovendo iniqüidades e injustiças
Se nos descuidarmos, a globalização, ávida por lucro, chega e destrói tudo que temos e ficamos sem identidade, sem rumo e aí fatalmente perderemos, em nossa região Amazônica, o que ainda resta de nossas riquezas naturais (madeira, minérios,água, biodiversidade, terras, etc) humanas e culturais das populações locais, causando verdadeiro estrago antropológico, conforme quer o perverso mercado globalizado.
Usando as narrativas orais valorizo o que é do povo fortalecendo a cultura dos simples para que não se desencantem, não percam essa dimensão de sua identidade, aquela que sempre distinguiu nosso humanismo. Salvaremos pelo menos a cultura de resistência nesse embate por uma democracia participativa baseada na promoção e respeito aos direitos humanos e nos valores construídos pela sociedade civil, porque a cultura do consumo quer nos impor um modelo de desenvolvimento com valores muito discutíveis para modificar nosso mundo cultural e vivencial enquanto povos que somos da Amazônia, pois o capitalismo quebra todas as formas de solidariedade porque vê nelas resistências ao seu desenvolvimento e então promove a dissolução da vida social nas comunidades das ilhas e vilas e uma forma de união de nosso povo sempre foi através da festa de santos e encantados - para mencionar aqui os antropólogos Anaiza Vergolino e Napoleão Figueiredo - , da irmandade, da comida, costume de beijar fita das imagens de santo, dança, cantiga, beberagem ou seja, da cultura e do modo de falar com sotaque diferente que o sistema quer calar porque a língua é nossa principal identidade.
Desculpe ter-me alongado, mas faz-se necessário prestar estes esclarecimentos diante de sua pergunta que certamente decorre do vislumbre de sua atividade de mestra.
3. De onde e como surgiu inspiração para a composição de sua primeira obra “Cânticos do Amor Amado”?
R – Mostrava também meus trabalhos aos colegas do curso clássico do CEPC – colégio estadual Paes de Carvalho - na década de 1970, plena ditadura militar que nos desagregava. São exercícios de expressão poética de quem cultivava a leitura de mestres como Manuel Bandeira, Carlos Drumond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Ferreira Goulart, João de Jesus Paes Loureiro, Bruno de Menezes, José Sampaio de Campos Ribeiro, José Ildone Favacho Soeiro, Sengor, Pablo Neruda, Fernando Pessoa , o poeta espanhol Federico Garcia Lorca, além dos cineastas Píer Paolo Pasolini, Luis Buñuel, Glauber Rocha, Luchino Visconti, Bergman, Godard, Claude Lelouche, gente da mpb como Caetano Veloso, Chico Buarque, Vandré, Jackson do Pandeiro, Luis Gonzaga e muitos outros. Estava iniciando a minha juventude sob a mordaça do regime ditatorial e queria também falar de amor, do muito amor que explodia em mim e precisava espocar para ser compartilhado e maturado para as investidas fenomenológicas.
4. Em Antônia Cudefacho a protagonista é uma mulher “pública”, mas a cima de tudo poderosa, de personalidade marcante, cuja paixão por um padre a leva aos extremos. É uma encíclica socialmente brasileira ou tem muito da peculiaridade cametaense?
R- Denominei de encíclica cametaense e por isso, “ socialmente brasileira” como você diz e expliquei o porque nas primeiras páginas do romance. Sou muito cioso, cuidadoso e respeito muito a inteligência do leitor. Aqui é também o universo, não preciso ir a Londres. Canto daqui deste “ chão cametaense” como dizia o nosso saudoso escritor conterrâneo Victor Tamer, para o mundo. Claro que a peculiaridade é cametauara, é isso uma levada que procuro registrar de forma indelével nas mentes, para que possamos pensar nossas qualidades de caboclo, nossa pujança, nosso modo especial de ser, de amar, de falar, de ser afetuoso com o outro, de ser solidário. Essa é uma peculiaridade muito especial do “ maparauara” como diz o Dmitrius Braga. Quero esclarecer que na pesquisa que fiz na cidade de Cametá, constatei que o amor entre os dois, era recíproco, cheio de visgo.
5. Em algumas de suas obras, (como em Sibele Mendes de Amor e Luta; Vera; Lâmina Mea; Antônia Cudefacho...) o senhor se mostrou um profundo conhecedor da condição feminina. Isso é mais uma preocupação especial do seu estilo literário?
R - Não sou conhecedor, procuro ser um atento e aplicado estudioso da alma humana, sobretudo da alma feminina de quem gosto muito. Aqui, o feminino é Amazônia, as amazonas, na estética amorosa que legitima as cametauaras e parauaras em geral nessa bela composição de fêmeas famintas de sensações e emoções lecionadas na magia da natureza, beleza infinda exposto no corpo ardendo regrada em ciclos inhacosos atraentes que se rebelam por cabanagens penugens dos cabanos entre noviscas heroínas de uma situação opressora carente de devaneio e libertação. Corpo e ânima que se animam na fisionomia política do agressor/opressor, memória ingrata de filhamento sem paternidade que o boto assume com a ternura e afagos de que gostam e sabemos compartilhar na fortitude peculiar delas que o sistema quis incutir como fragilidade. Mulher é amor e poesia, então, poemas de amor para as mulheres, sempre !
6. O senhor publica mais narrativas do que poemas, essa predileção pelo contar tem a ver com o gosto povo amazônico?
R – Não sei se tem a ver com o gosto do povo amazônico, não me dediquei a meditar esse detalhe que você acentua, sem dúvida, importante para ser analisado. O poema é sempre mais difícil de ser elaborado. Posso te dizer que gosto quando faço prosa-poética. Paulo Nunes me disse certa vez que sou melhor na poesia. É generosidade do colega e amigo escritor. Contudo, é bom esclarecer que meus livros não encalham nas estantes, tenho uma boa conexão com o público leitor a quem estou sempre atento aos seus anseios de leitura literária sem perder a minha liberdade criativa de escrever o que quiser, quando desejar, com o cuidado de não liberar o texto como um autômato ao mero sabor do impulso da inspiração.É preciso obedecer certos regramentos e não descuidar-se da técnica que se aprende lendo as grandes obras dos grandes mestres para o devido aprimoramento, afinal, escrever é uma arte, a arte literária e não mero diletantismo.
7. Qual das suas obras é a sua preferida? Existe aquela que o senhor contempla com mais carinho, e que se pode dizer que é a síntese de Cametá?
R – Não sei se algum desses livros serve como a síntese literária de Cametá. Sei que em todos está a minha essência, a raiz cametaense.
Gosto da bravura cabana da Sibele no “Sibele Mendes de amor e luta”, o primeiro romance publicado; fico comovido com que expressa ternamente a nossa humanidade cabocla a personagem Izabella no romance “Remos de Faia”, gratifica-me ter tido a oportunidade de expor em prosa poética a grandeza, a beleza e a sensualidade da mulher cametaense através da pedagogia do desejo manifestada no rastro de sedução sobretudo pelo farfalhar da palavra odorizada de inhacas atrativas que é marca registrada nossa, queiram ou não, no romance “Antonia Cudefacho” ; aprecio a densidade das personagens femininas que freqüentam os contos de “Marailhas”. Falaria de cada livro (qual de um filho) com muito afeto. Mas, para ser objetivo com sua pergunta, presentemente, tenho muita afeição ao texto que produzi no livro “Matintresh”, é uma proposta de nova estrutura narrativa que está ligada à mundiação e que se arreganha já na orelha da obra para a análise do leitorado e que se aproxima ao que estou quase chegando, que é o hiper-romance que se constrói por meio de um núcleo comum com muitas histórias que se entrecruzam, é um pouco aquilo de que faz apologia como grande rede o escritor italiano que nasceu em Cuba,Ítalo Calvino em sua obra “ Seis propostas para o próximo milênio” , ao tracejar teorias acerca do romance contemporâneo. Vamos ver como se sai essa minha performance quando publicar em breve o livro GALO TESO.
8. Infelizmente a Literatura da Amazônia é pouco divulgada nas demais regiões do país e até mesmo em nossa cidade. São raros os escritores que conseguem ser consagrados em vida. O senhor acha que o Cânone Literário Nacional pode ser responsabilizado por isso, uma vez que o norte quase não é lembrado pelas grandes academias?
R- Esse papo é longo e vamos tentar responder por partes. Sim, a literatura aqui produzida não é conhecida nem em Belém onde nos concentramos. Por quê ? Faltam políticas públicas que facilitem o acesso ao livro e ao escritor local. Não valorizamos o que é nosso.
A questão do Cânone é uma dialética desgastante, me parece, porém, faz-se muito necessária o seu debate público, porque ele se esconde, fica entipitizado nas fendas, anteparado nos biombos para observar e influenciar sem ser visto, fica recôndito como costuma se comportar quem quer agir subrepticiamente, claro, prejudicando mais que ajudando.
Meu ponto de vista é que sempre vão existir, infelizmente, grupos que elegem os seus preferidos e aí estão laborando uma espécie de cânone particular que fica grave na medida em que esse mandarinato acaba influenciando nacionalmente e em áreas acadêmicas para que só se trabalhem os que figuram naquele cânone, em detrimento de outros tão bons ou até melhores, que,infelizmente, não caíram, por uma razão ou outra, no gosto do circulo do mandarim que governa todas as ações nesse sentido, não permitindo o ingresso de outros que purgam seus pecados no limbo do esquecimento.
Qual o escritor paraense que figura no dito cânone nacional? José Veríssimo, Inglês de Sousa, Dalcidio Jurandir, Ildefonso Guimarães, Raymundo Moraes, Benedito Nunes? Qual ? Nenhum. É por falta de competência e de qualidade? Não, é puro preconceito, nós não fazemos parte da cultura nacional, nem da local que só se interessa pelo que vem de fora, nós não valorizamos o que é nosso até porque nem sabemos ou conhecemos o que é nosso!
9. Vivemos em uma região afastada dos grandes centros culturais, campeões em consumo de livros, como Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais. Entretanto, nosso estado tem algumas particularidades como a venda de livros não só em livrarias, mas também em farmácias, supermercados, sebos... Ainda assim as pesquisas não nos são favoráveis. O que, em sua opinião, poderia mudar essa realidade?
R – Tenho que repisar o assunto e vamos por partes.
Sabemos que pós-modernamente houve uma expansão também no conceito de cultura e de escola. Escola não é apenas aquele espaço físico convencional. Na verdade, escola no mundo moderno se dá em toda parte porque em qualquer lugar estamos aprendendo. Cultura tem nos dias de hoje uma abrangência imensa e me atenho aqui a uma dimensão dela, chamada cultura letrada, livro que deve ser ofertado à aquisição em toda parte, também nos supermercados, etc. , sobretudo quando não se tem livraria e as temos em tão pouco número no Brasil e em Cametá, podemos contar nos dedos da mão e sobram dedos e quando existem são mais papelarias que livrarias, credite isso também ao capitalismo selvagem que quer você cada vez mais consumidor compulsivo de bens materiais e não de bens culturais e jamais, leitor porque isso implica em consciência crítica e política, em mudança de comportamento, em suma, em liberdade.
Precisamos de políticas públicas que efetivamente contemplem o livro e disso naturalmente decorre a educação e a cultura. Cada gestão de governo tem que investir muito no binômio educação e cultura que passa pela leitura e se dá por meio do livro. Então essa realidade pode e deve ser modificada com a nossa ação concreta, exigindo - através de solicitações, apelos, reivindicações escritas, passeatas -, cobrando dos deputados,vereadores, senadores, dos partidos políticos, dos líderes comunitários, das igrejas, da diocese, dos pais, dos professores , dos governos (em todas as esferas) a adoção de bibliotecas públicas em todos os municípios. É bom que fique claríssimo que quando se fala em biblioteca, está se pensando em local aprazível, com bom atendimento de profissional, no caso bibliotecárias, espaço agradável,limpo, bem arejado, bem iluminado,informatizado, confortável e sobretudo, com bom acervo - inclusive as obras dos autores autóctones e se estimular a presença deles nesses ambientes para que o povo os reconheçam e identifique seus livros - permanentemente atualizado e que funcione 24 horas. Em nosso caso cametaense, que haja bibliotecas em todas as escolas, especialmente as que ficam nas beiras dos rios de nossas ilhas e que o livro, o jornal, a revista tenha espaço de leitura nas casas, rabetas, pu-pu-pus, lanchas,cascos, balsas, ônibus, trapiches, clube de mães, centros comunitários,bancos das praças clubes de futebol, estádios, quadras de esportes, associações, espaços de festas, bares, lanchonetes, banca de cachorro quente, agremiações carnavalescas, de serviços, paróquias, capelas, postos de saúde, hospitais, câmaras municipais, ministério público, fóruns, tribunais, enfim, em todo lugar e toda parte os livros devem ser “ deixados” para que o outro leia e lendo, pense e pensando, modifique as estruturas sociais, trabalhe por justiça social, progresso inclusivo. Na adoção de uma educação leitora e literária na escola, através do livro e da leitura podemos nos tornar cidadãos culturais leitores que analisam seu entorno e podem dialogar com outros em qualquer parte do mundo expressando sua identidade. Não se pode existir sem leitura. Ler é o maior espetáculo da terra !
10. Qual sua receita para se tornar um bom leitor e, consequentemente, um bom escritor?
R - Essa pergunta, diriam os mais experientes, os mais preparados , os mais sábios, os que estão na caminhada da militância há mais tempo: olha, não entra nessa, é uma calça-justa, uma casca de banana,uma armadilha ! Porém, como em literatura, na vida, sou sempre audacioso, corajoso, ousado, atrevido, inquieto, irrequieto, hiperativo, indomável. Arrisco-me sempre ! E ai de mim se não arriscar !
E então, lauvai, parentes Doriedson, Cassique, Danúzio, Mocbel, que estão na minha mutuca. Meu Deus, o que seria um bom leitor e um bom escritor?
Entendo nessa pergunta que você se refere a quem pelo menos já é leitor, certo? E em assim sendo, já estamos a meio caminhado andado e então a receita é a mesma com os medicamentos que vem usando: ler e ler e continuar lendo preferentemente as boas e grandes obras dos grandes e bons autores da literatura universal, ler tudo, tudo e ir pouco a pouco fazendo escolhas, pois é impossível ler tudo no tempo que o ser humano vive neste planeta Terra.
Creio que na seqüência raciocinada do questionamento, a pessoa, pelo menos, já é um escritor e por isso, entendo que para se tornar um “ bom escritor”, a receita também é a mesma prescrita ao “bom leitor”, que, para obter o resultado que espera, deve administrar o remédio em dose redobrada: ler e ler e ler e ler sempre, tudo e evidentemente, escrever e escrever, reescrever, reelaborar, rever, revisar, e depois fazer uma peneirada para separar o joio do trigo, aqui posto simbolicamente. E deixar o tempo fazer sua parte na avaliação. Quem gosta da atividade, quem é dotado deste dom, se habitua a ler e escreve diariamente, é o mínimo que pode fazer para desenvolver sempre mais e multiplicar os talentos recebidos, para habilitar-se ao que se propõe, ser cada vez melhor escritor. O mestre Haroldo Maranhão, paraense de nascimento e grande prosador de nossa literatura receitava: mesmo sob dores, se você é escritor, escreva.
Que tá, parentes, me sai bem? Orra, meu!
Nenhum comentário:
Postar um comentário