domingo, 31 de maio de 2009

TU, SUMANA, BOIUNASTE-ME* !

Salomão Larêdo escritor e jornalista

O gaiola - lanchabarco - se aproximava abrindo as pernas das águas tucupi no amarelo tipitinga enbarrosado que me saudou em nome de uma Belémpajé de boca maior que a da cobra-grande e mergulhei, qual Jonas, da Biblia, na baleia, no líquido amniótico tisnado de açaí, bacaba e bosta de seu ventre, zonzo, sem saber direito onde estava.

Mundiado, tateando devagarinho, fui gostando do aconhego e plíquite: até parece que nasci aqui nesta Belém quase quatrocentona.

Para quem viu o Tocantins da beira da ladeira da Vila do Carmo passar em direção à Tucuruí, Cametá era a cidade maior que vira até vislumbrar da bujarronabaía a porruda Belém que me encantou, fisgando-me por seus pitiús inhaquentos.

E tudo nela era colorido. O mercado de peixe, as latas de óleo de cozinha da marca Pajeú cheias de pimenta de todo tipo e tamanho e a frutaria que virava de preço e quantidade na quase hora da boiosa: piramutaba cozida feita por donalady com alfavaca, chicória, vinagreira e uma pimenta no prato espremida, farinha de Bragança com arroz e feijão do sul e capilé.

Veropeseei muito para saber de ti, Belém, que entre luas cheias e lançantes, fugias, dormias amofinada,
arranchada e à vontade no engenho Murucututu te
espreguiçando na fumacinha da enchente do rio Guamá em frente de ti mesma:
veropesobaíafeiradoaçaífortedascostelasvelhacidadevelhapalafita.

Penei, jeouviste, penei e ralei.

Rodei todas as tuas passagens: onze bandeirinhas, apertar da hora, santa fé, piquiá, quarubas, jambu...

Perdi-me nas tuas ruas, avenidas praças, prédios, museus, bosques, mangais,
 estradanovabaciacondorpalaciodosbares.

Nos suores e odores, chuvas, torós e trovoadas, de quando em vez , como matinta perera, assobiaste, na tua reconquista, no pé do meu ouvido.

Comi manga com febre, bebi azeite de andiroba e tu nem aí pras minhas angústias.

Muita vez senti teu cheiro e não te apercebi, verões e verões nas ilhas do Outeiro, do Mosqueiro, Combu, Papagaio e ilhas das Onças, trajavas folhas de aninga no teu desfile praianopósmoderno.

Comecei a frequentar tuas cumeeiras,aningais, magias e mistérios.

E quantas vezes, te esperando, apreciei as sinfonias dos periquitos na samaumeira do largo de Nazaré, quando, tu, toda pavulagem, acompanhavas o Círio com outras Marias maltrapilhas carregando bilhas, patetando à berlinda da nossa senhora de Nazaré do rosto paraense escalavrado e do filho de cara suja de fiapos de manga, mas, gente poderosíssimamente amável.

Outras vezes te esperei no Mangueirão , num repá amuado e nem me deste bola. Comias churrrasco de gato com pimenta e cerveja, numa boa.Égua-te, minha.

Volvia às canôas e na carmelita do Milton me embrulhava nas velas vermelhonas/ amarelonas/azulonas.

Na escola, as latas de bombom da rendapriori faziam minha alegria naquele imagem do casquito no veropesiano aquário urubulesco do teu museu/mundé.

O melhor da festa era quando, cabocla, tu, igual a Devargira, merengavas na gafifa do estrelinha e amanhecias dançando nas tascas ao som das guitarradas e dos curimbós e no meio da farra, banguê retinido, pegavas a retinida e te mandavas pra MangabeiraBaião sob pseudônimo de Beneditamargareth pra rolar no tupé dos ciossilêncios. Então, floridas montarias entravam a saudar são Benedito da Praia da turma do peixe-frito.

Batidas de genipapo e taperebá arrematavam baita sopa de mocotó nas feiras enfileiradas em que prostimutaram tuas ruas, avenidas, praças, becos e vilas.

Ah, quanta noite bebemos garapas nas sambadas da Pedreira e fomos ver o tirafama no Guamátucundubaufpa.

No batizado do nosso pirralho, maniçoba no terreiro, munguzá pra meninada e currupiu pra criançada faziam a alegria de nosso enamoramento.

Comia samba de cacete nas zuadas de valdecans.

Te alembras quando nos banhamos de açaí no alguidar do Jurunas ? Ou quando tomamos passe que nos livrou do mau-olhado daquela seca pimenteira que o tajá curado e a arruda mandaram pras cucuias no banho de infusão noturna com pripriocas e japanas ofídicas de nossa madrugada semântica ?

Ah! Belémchama/Belémxamã, como te esperei no sonho de não sonhar !!!

No almoço ajantarado com que me recebeste em teu Palacete Azul apinhado de gente, comi ovos de tracajá, que trouxeste de Alenquer, saboreei tucunarés de Santarém, aviús, de Cametá, goiabas de Gurupá, pivides de Muaná, surubim de Redenção, apapás e jatoxis, da Vigia, queijos de Paragominas, jabuti , de Breves, castanha de Marabá,pamonhas de moronguetá, pastel, tacacá,mucajá, maracujá,gergelins, sarrabulhos e sangue verde - do mato, sangue azul – da rainha, sangue vermelho – do amor tupinambá caldo de jambu.

Sumana, ainda bem que o tsunami não vinga aqui.

No tempo que nunca houve, me amparaste, nos encantamos mutuamente.

Ficaste cantando waldemarhenrique para me ninar no teu colo, paixão que não tem fim, pois nem teve começo , é apenas um imenso amor de quem sabe amar e por isso não fica mal com Deus e com ninguém. Me amas, Belém ?

Boiúna-me, sempre.Boiúna-me, sempre. Sempre mais que sempre

E para todo o sempre, pois sou o teu sempre amado Salomão Larêdo.

Parabéns, Belém, pelos teus 389 anos de amor !!!! em 12 de janeiro de 2005.


*Publicado originalmente no jornal o Liberal,em 12.01.2005

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