ENTREVISTA COM O ARQUITETO CLÁUDIO PASTRO
Salomão Larêdo, escritor e jornalista
É agradável encontrar um povo com fortes raízes cristãs, católicas A beleza “ingênua” e simples do povo e da natureza, mas, sobretudo, a verve do Cônego David Larêdo, Pároco da Igreja da Conceição, permitiram a beleza divina desposar a humana em solo amazônico. Eu só presidi o enlace, conta o arquiteto Cláudio Pastro, dizendo:
ACEITEI O “DESAFIO” DE CONSTRUIR UMA IGREJA NA PERIFERIA DE UMA IMPORTANTE METRÓPOLE AMAZÔNICA, NO BAIRRO DO JURUNAS, EM BELÉM.
Não estamos mais nos tempos do fausto e do poderio da igreja conjugados ao luxo e ao poder soberbo de dominação. Ao se pensar em construir uma igreja é precioso se perguntar: o que é ser cristão e igreja? Tudo mas decorrerá dessa resposta.
Fonte: http://www.portalk3.com.br/Artigo/memoria/artista-plastico-renomado-viveu-parte-da-infancia-em-sao-carlos
O MUIRAQUITÃ,
ELEMENTO DA CULTURA AMAZÔNICA ENTRA COMO SIMBOLO DA RESSURREIÇÃO NO PAINEL DA
IGREJA DA CONCEIÇÃO.
Parte inferior do painel
Hoje há um grande e forte processo de secularização na igreja e um fenômeno de fundamentalismo – seitas - com uma confusão comercial em tudo isso mais um “sentimentaloidismo” nas expressões pentecostal. Todo esse caos advém de uma falta de cultura religiosa por causa do cristianismo estar longe de suas raízes.
A religião faz parte da essência do homem. Na sociedade atual prevalece o individualismo em suas variadas formas - paganismo, ateísmo, hedonismos − de contracultura e contra humanismo. A característica do cristianismo é comunitária. Aí a religião Católica deve entrar não mais com seus ranços seculares e o pedantismo clerical, mas como sua essência “à volta às fontes”.
DENTRO DA IGREJA
DA CONCEIÇÃO HAVERÁ UMA PISCINA − CRIADOURO DE PEIXE − PARA BATISMO −. É CLAÚDIO PASTRO
QUEM CONTA:
Batistério ainda em construção
CRIAMOS AO LADO DO EDIFÍCIO-IGREJA A CAPELA DO BATISMO/BATISTÉRIO (SEMPRE PRESENTE NO 1º MILÊNIO) NA FORMA DE PISCINA (CRIADOURO DE PEIXE) EM CRUZ (SE NÃO A ÚNICA CAPELA BATISMAL NESSA FORMA, SERÁ UMA DAS RARAS).
O batismo é
parte fundamental na educação da fé (sacramento de iniciação) longe dos mitos,
fetichismo, moralismo e modismo social que tem acompanhado esse sacramento.
A FELICIDADE É O ESCOPO CRISTÃO E DAS RELIGIÕES
Fiz, pelo correio
convencional, uma entrevista com o arquiteto Cláudio Pastro, paulistano,
domiciliado e residente em São Paulo, construtor de templos religiosos pelo
mundo e que construiu também a igreja da Conceição, em Belém, no bairro do
Jurunas. Artista famoso, arquiteto sacro consagrado, escritor de obras
apreciadas é superrequisitado pelo Vaticano. Mas, tem sofrido com a fragilidade
de sua saúde: “Amigo
Salomão, perdoe-me
pelo longo silencio, mas o ano de 2011 foi-me tenebroso. Passei por 17
cirurgias, UTI e no mês de setembro fiquei internado com infecção hospitalar.
Espero que minhas respostas lhe agradem – é o mais sincero de mim. Quantos as
fotos, o secretario do Cônego David, o Adriano, tem uma imensidão de fotos
documentários. Bom trabalho e bom e feliz 2012 ! C. Pastro 01 de janeiro de
2012.
Abaixo, a entrevista e
você, leitor, pode fruir e usufruir desse importante e profundo conteúdo
filosófico, eclesial, bíblico, arquitetônico, vivencial, cultural, artístico e
sobretudo, humano de Claudio Pastro.
SL.: Você, famoso artista paulistano com fama mundial na construção sacra, sobretudo de templos religiosos à igreja católica na Europa e no sudeste do Brasil, como foi aceitar e construir um templo na região amazônica, norte do Brasil, na cidade de Belém e no populoso bairro do jurunas, periferia da cidade, no seio de gente pobre e de limitado grau de instrução e cultura-religiosa?
CP.: Antes de
tudo, sou cristão e a arte sacra para mim, é um serviço à igreja, povo de Deus,
esposa de Cristo, corpo místico de Cristo. Na Amazônia ou em qualquer lugar do
mundo, é ao Cristo que sirvo e ao seu Mistério presente em cada ser que vem ao
mundo. Para tanto, pouco importa a condição social e cultural do povo. Arte
sacra e ação litúrgica tratam da manifestação de Deus e do anuncio desse mesmo
Deus para o povo daquele lugar.
Em 2008 (?) fui
convidado por D. Orani João Tempesta, então arcebispo de Belém – Pará, a dar um
curso de arte sacra para o clero, arquitetos e pessoas afins. Foi o cônego
David Larêdo quem dispôs sua paróquia para esse evento, assim como foi o único
padre que aceitou o desafio de executar um projeto seguindo as normas do
Concilio Ecumênico Vaticano II. Graças ao padre David, sua vivencia religiosa e
sua visão simples, mas profundamente humana e eclesial aceitei o “desafio”
desse “acontecimento divino” (a construção de uma igreja) na periferia de uma
importante metrópole amazônica.
SL.: Clima quente e umidade de quase 98%, na
beira do rio – fartura de água – e no início da maior floresta tropical do
mundo, que material usou e como planejou para conjugar beleza, simplicidade,
bom gosto e não agressão ao meio ambiente, à natureza humana e sobretudo
à tradição cultural do homem amazônico ?
CP.: Como sempre,
tive que aliar as condições locais ao fato cristão. Hoje, não estamos mais nos
tempos do fausto e do poderio da igreja conjugados ao luxo e ao poder soberbo
de dominação. Ao se pensar em construir uma igreja é precioso se perguntar: o
que é ser cristão e igreja? Tudo mas decorrerá dessa resposta.
Com sutileza e
elegância, desejei uma construção “acolhedora” que convide a todos a entrarem,
sentirem-se abrigadas, protegidas não só das intempéries externas, mas, sobretudo,
“do mal do mundo e suas artimanhas” (“Eis a tenda [morada] de Deus com os
homens”. Ap 21,3). Protege do calor do sol e da chuva. As paredes em “pedras
porosas” (“vós sois pedras vivas desse edifício espiritual”. 1Pe.2,5); o altar
em granito maciço (“a pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra
angular”. Sl. 117,22 e o “altar é Cristo” São Cirilo de Jerusalém, séc. IV) e
as portas de vidro; tudo isso permite-nos ver e sentir a natureza alem de
revelarem ao homem o que ele é: barro, natureza, poeira cósmica e não homens de
shoppings, da sociedade corrupta e de competição. “De longe” lembra-nos “a
grande oca” em meio às “demais ocas” do bairro. O edifício é um lugar de união
que congrega a todos em torno do altar (= Cristo), rocha firme, estabilidade da
nossa vida. O grande painel em azulejaria corresponde às raízes ibéricas e nos
dará o encanto, o maravilhamento de um Deus que vem até nós (Jesus Cristo) e o
sentimento de fazermos parte dos cidadãos do céu, de um grande cortejo de batizados
(homens da terra e do céu). Com delicadeza veremos no painel alguns elementos
da cultura local, por exemplo, o muiraquitã, símbolo da ressurreição para os
povos primitivos das Américas.
O espaço sagrado cristão (chamado de Jerusalém celeste que desceu do céu naquele lugar) (ver Ap. 21,1-4) testemunha Jesus Cristo e “sua raça conquistada” (ver Ap. 5, 9-10) em meio à Babilônia externa. Revela-nos por sua forma e materiais um lugar de salvação mais que “espelho” das realidades locais.
SL.: Você
é um dos responsáveis pelo Santuário de Aparecida e portanto conhece e vive
há muito tempo a experiência fenomenológica mariana dentro do sincretismo religioso do brasileiro, já conhecia o fenômeno Círio de Nazaré, em Belém e onde isso influiu na construção da Igreja
de Nossa Senhora da Conceição no momento
em que aceitou o convite do pároco, o cônego David Larêdo?
CP.: Os
“fenômenos sincretistas” da simples gente brasileira (Aparecida/círio de
Nazaré) são um dado histórico e carregam heranças de um tempo, porém, não são a
razão do ser cristão (do evangelho) que é infinitamente maior. Para o pe. David
Larêdo e para mim essa consciência é bem clara e nos vem do Concilio Ecumênico
Vaticano II que se resume numa frase: “Ad
Fontes ”, às fontes e raízes do cristianismo. O edifício cristão, antes de
tudo, é escatológico, isto é, testemunham-nos os fins últimos: “quem somos,
para que e porquê existimos e para onde vamos”.
SL.: O caboco paraense, mestiço
resultante do negro africano, do índio nativo
e do branco europeu , tem
imensa fé na
Virgem da Conceição, de Nazaré, a Senhora das águas amazônicas, a mãe d’água e do rio, gosta de festa de santo e de
encantado do rio e da floresta, das beberagens, das danças e festas,
foguetes, vai se ver n esse novo templo
?
CP.: Como já
observamos acima, o “templo cristão” não é primeiramente, fator sociológico de
expressões locais, mas lugar de evangelização. Na Jerusalém Celeste (o
edifício) não há templo (ver Ap. 21, 22), pois, para o cristão o “templo é
Cristo”, e, portanto, o templo (espaço) deve nos revelar o Cristo. Num segundo
momento (guardando as devidas proporções) poderá ser ocupados por folguedos,
concertos... Expressões culturais. Apesar de ser um espaço em honra da
Conceição, em primeiro lugar pertence às coisas do Senhor no cumprimento do
Mandato Novo ai celebrado “a divina liturgia” (Ministério Pascal ou Santa
Missa).
SL.: Qual
a importância hoje de religião, de templo, de ser cristão, católico na vida do
homem da era da informática que se apresenta individualista, anti-social,
cético, descrente e é eminentemente consumista de bens materiais?
CP.: Hoje há um
grande e forte processo de secularização na igreja e um fenômeno de
fundamentalismo (seitas) com uma confusão comercial em tudo isso mais um
“sentimentaloidismo” nas expressões pentecostal. Todo esse caos advém de uma
falta de cultura religiosa por causa do cristianismo estar longe de suas
raízes.
A religião faz
parte da essência do homem. Na sociedade atual prevalece o individualismo em
suas variadas formas (paganismo, ateísmo, hedonismos) de contracultura e contra
humanismo. A característica do cristianismo é comunitária (igreja = assembléia,
corpo). Aí a religião Católica deve entrar não mais com seus ranços seculares e
o pedantismo clerical, mas como sua essência “à volta às fontes”. Não é à toa
que criamos ao lado do edifício-igreja a Capela do Batismo/Batistério (sempre
presente no 1º milênio) na forma de piscina (criadouro de peixe) em cruz (se
não a única capela batismal nessa forma, será uma das raras). Assim, o batismo
é parte fundamental na educação da fé (sacramento de iniciação) longe dos
mitos, fetichismo, moralismo e modismo social que tem acompanhado esse
sacramento. Eis porque o espaço sagrado é um espaço mistagógico (educa a fé)
com a função de introduzir, conduzir o fiel à verdade de sua fé a fim de que
tenha equilíbrio de vida e seja feliz. A felicidade é o escopo cristão e das
religiões. A religião cristão-católica gera uma qualidade de vida e bem estar
onde a beleza nos remete à magnitude do Evangelho. O lugar religioso é o lugar
do encontro do céu com a terra e dignifica o homem, lhe dá esperança, pois o
coloca numa dimensão maior, bem acima da sociedade explorada. (“todo batizado é
um rei, sacerdote e profeta”).
O lugar (igreja)
da expressão religiosa é:
− Lugar de oração,
nobre lugar onde quem entra se ajoelha, pois sabe que é criatura dependente do
criador.
− “Oásis”, lugar
de repouso que permite refazer-se, renascer, sair da dura realidade do dia a
dia e voltar fortalecido para enfrentar essa mesma realidade.
− Lugar de
encontros onde visualizamos os irmãos, a comunidade e força de um povo.
− Lugar-aula onde
recebemos os verdadeiros ensinamentos do Senhor.
− Lugar do
“ágape”, da Eucaristia, ação de graças e banquete celestial onde se pode
participar, por antecipação, do banquete eterno.
SL.: Quando a construção será entregue à inauguração?
CP.: Penso que no
1º semestre de 2012, pois a inauguração (consagração ou dedicação) está
prevista para junho de 2012.
SL.: Como
você relata essa sua experiência estética, em Belém, metrópole da Amazônia ?
CP.: É agradável
encontrar um povo com fortes raízes cristãs, católicas e, consequentemente, ter
correspondência, diálogo dócil e responsável com o desejo pelo melhor. A beleza
“ingênua” e simples do povo e da natureza, mas, sobretudo, a verve do Pe. David
Larêdo, permitiram a beleza divina desposar a humana em solo amazônico. Eu só
presidi o enlace.
C.Pastro
31 XII 2011 para 2012
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