quinta-feira, 9 de abril de 2009

O CLUBE DA LAMPARINA E A HIDRELÉTRICA DE TUCURUÍ

FALTA LUZ PARA OS DONOS DO RIO DE ONDE É GERADA


Salomão Larêdo, escritor e jornalista

Mesmo depois de vinte e cinco anos da inauguração da hidrelétrica de Tucuruí, em 1984 e há trinta e quatro anos do início da construção, em 1974, num aspecto positivo de consciência sócio-política - talvez manifestação do espírito cabano - o povo de Tucuruí e do Baixo-Tocantins não esquece o fato de não ter sido sequer consultado e/ou cientificado a respeito da construção da usina hidrelétrica de Tucuruí – a quarta maior do mundo com a capacidade recentemente duplicada e publicada de 8,4 mil MW que tornou o Estado do Pará o sexto maior produtor e o segundo maior exportador de energia bruta do país que parece já não a temos a julgar pela escuridão no Estado e não podemos usufruir deste bem que a água nos dá - a natureza sempre foi generosa com Tucuruí - e nem para outros possíveis consumidores eletrointensivos - e suas conseqüências e que acarretou e ainda acarreta, muitos inconvenientes e estragos ao meio-ambiente e ao homem, à mulher que vivem às margens do rio Tocantins estrangulado e por isso até hoje vedado à navegação.
Quando visitei a usina em novembro de 2007, algumas turbinas estavam fora de operação, e não era por causa da seca do verão (eu as vi, de perto, em manutenção e sabia – embora nada tivessem me dito na visita - que teria havido incêndio causado por um possível curto-circuito) e nem em decorrência do engradeamento dos espaços que a empresa procedia para evitar possíveis invasões como já havido ocorrido e voltou a acontecer recentemente com o pessoal do MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens - em razão do não-cumprimento de acordos agora relativo ao pagamento, como se propala, de indenizações às famílias que tiveram que abandonar suas casas por causa da construção das eclusas ao retorno da navegação do rio Tocantins.
Vi morador do local quebrando e vendendo algumas pedras à construção das eclusas para conseguir uns trocados à sobrevivência na precária moradia perto do incômodo barulho diuturno do canteiro de obras que nenhum ser humano merece e deve conviver. Era tão óbvio o resultado do que veio a acontecer porque o homem deve ser tratado com um mínimo de dignidade. Nesse contrário que se via, era iminente e evidente a ação. O povo paga com a vida o bem-estar de poucos.

PAVIO CURTO

O bom é que dos pavios das lamparinas queimando querosene brotam chamas acesas que estão iluminando as casas dos moradores na cidade de Tucuruí que criou até uma entidade, o “Clube da Lamparina", justamente um jeito irônico de conviver com as constantes falta de energia na cidade que produz e exporta energia, o que, mínimo é uma situação paradoxal ou para confirmar a expressão popular: casa de ferreiro, espeto de pau numa dialética da contradição.
A sátira pegou. O povo, sábio, mais uma vez se expressa e vai buscar nos seus primórdios a demonstração de que é prudente não se desfazer desse objeto simples chamado lamparina diante do progresso tecnológico, pois nos apagões constantes, para livrar-se da escuridão é preciso recorrer exatamente à lamparina, como nos velhos tempos.
O clube tem diretoria, sede, estatuto, associados e se reúne quase que diariamente na rua Santo Antonio, na cidade de Tucuruí e nasceu justamente porque os moradores são vítimas de constantes falta de energia.Um belo dia os moradores pensaram : e porque não fundar um clube?
Quem explica é a secretária do Clube, Socorro Pompeu, fazendo questão de ressaltar que – ainda que polua – a lamparina é o meio barato e eficaz que encontramos para quebrar o galho nessas ocasiões de falta de luz - , até porque é a diretora do Condema – conselho de meio-ambiente de Tucuruí e sabe o quanto é importante dar exemplo e cuidar. estertores, infelizmente. O prefeito do município é o maranhense Raimundo Ribeiro de Souza (Diquinho) que sempre vai ao igarapé da Jaqueira com seus amigos e também o vice-Prefeito Orlando Silva, apreciar as águas descendo encachoeiradas e teve uma idéia: construir uma micro-hidrelétrica ali, a cidade vive na base da lamparina porque a luz é precária.

Igarapé da Jaqueira

Diquinho

Tempos depois foi a Belém e o governador Jarbas Passarinho, ao término da exposição, despachou ao seu secretário: atenda esse prefeito sonhador!
As máquinas chegaram do Rio Grande do Sul, mas o então governador Alacid Nunes mandou para Santarém e destinou dois geradores a Tucuruí. Ribeiro que já havia, com recursos da prefeitura ,construído a represa, teve que contentar-se com os geradores e parou aí a realização do sonho.
Naquela altura as autoridades do Estado já sabiam da construção da hidrelétrica de Tucuruí, menos o povo. E Ribeiro, que depois se elegeu deputado estadual, conformou-se apenas com o muro de contenção de sua micro-hidrelétrica da Jaqueira.

Muro de contenção da micro-hidroelétrica da Jaqueira

Pessoal do clube toma como parâmetro esse “sonho” e diz que a primeira fase dessa micro-hidrelétrica equivale também a primeira fase das ações do clube que tem protestado pacificamente contra o descaso da empresa com a energia elétrica na cidade que é de péssima qualidade pelos constantes apagões e a iluminação pública urbana, precária.

FESTA DA LAMPARINA

Como movimento anárquico-construtivo, o Clube da Lamparina trabalha protestos solicitando audiência pública também com a Rede-Celpa e outras autoridades e para mostrar seu lado irônico, realizou o “Primeiro Baile da Lamparina “com um estrondoso sucesso que lotou o salão paroquial, local da festa que contou com a presença maciça da população. E para que ninguém pense que o clube ficou com a grana, a diretoria esclarece que o arrecadado foi entregue ao pároco de Tucuruí que empregou na feitura da porta de entrada do santuário de são José, padroeiro da cidade, pois a virgem da Conceição é a padroeira dos ferroviários.
O Clube da Lamparina, caso não tenha suas reivindicações atendidas, pretende protestar mais firmemente, após esgotar todos os meios amigáveis, fará demanda judicial e marcará presença no “pé da barragem” , ou como diz um dos associados: “soltar uma boiada de palavras, pois já vem há mais de dois anos amargando insucesso em suas reivindicações”.
O clube conta com o apoio da Associação dos Filhos e Amigos Solidários das Terras de Tucuruí – ASFATT e quer restaurar a história de Tucuruí com fotos, fatos, memória e objetos, pois até as locomotivas da antiga ferrovia, desapareceram. A sede de todas as entidades populares é no “Bar Everest”, de propriedade do famoso, popular e conhecidíssimo radialista, jornalista, historiador e antigo morador, João Marques, dono da maior audiência em programa de rádio, que fica na Rua Santo Antonio, 631-B, bairro da Matinha. Nesse mesmo local funciona também o Clube da Política e muitos outros, é uma espécie de birô central de informações de tudo que acontece em Tucuruí e lá que todos se abastecem e trocam notícias.


Nesta rua antes passava a estrada de ferro Tocantins

Os objetivos do Clube da Lamparina são : protestar contra o alto custo da energia e as mais várias formas de apagãos; mostrar com humor, as mazelas que ficaram ao longo da construção da hidrelétrica; integração intermunicipal; educação ambiental; restaurar a cultura social e reunir as diversas associações e clubes.
O símbolo da luta é a tradicional lamparina dos velhos tempos da Alcobaça da castanha do pará e das tribos dos Parakanãs e Assurinis,Urubus e Gaviões, donos do lugar e o movimento prestou no último dia do ano passado, homenagem aos 60 anos de emancipação política de Tucuruí , que aconteceu em 1947,desmembrando-se de Baião e tudo começou com a constatação da instabilidade da péssima energia elétrica ofertada para Tucuruí pela Eletronorte através da Rede-Celpa, ao contrário da energia refinada ofertada à Vila Permanente, onde moram os ricos, dizem os habitantes da cidade de Tucuruí que se consideram,os pobres e por isso, “ vítimas do que não presta”, completam .
E assim como a UHE de Tucuruí teve até agora duas etapas, o clube vai partir para a sua segunda etapa de construção de sua MHE- micro-hidrelétrica da Jaqueira, que lhe serve de parâmetro, ou seja, vai fazer outro protesto, pacífico, é claro declaram os associados.



quinta-feira, 2 de abril de 2009

PREFEITURA DE BELÉM CONDECORA O ESCRITOR SALOMÃO LARÊDO

No dia 12 de janeiro de 2009, em comemoração aos 393 anos da fundação de Belém, o escritor Salomão Larêdo, recebeu da Prefeitura Municipal de Belém, a maior comenda do município, denominada “ Medalha do Mérito Francisco Caldeira de Castelo Branco”, fundador de Belém, em 1616.
A cerimônia aconteceu às 19 horas no Cinema Olímpia, espaço cultural da PMB à Praça da República, presente diversas personalidades agraciadas com a medalha.
A Prefeitura de Belém comunicou ao escritor a aprovação de seu nome para o recebimento da medalha num reconhecimento do governo municipal a expressão intelectual e referência pública cultural que é referido escritor .
As fotos abaixo documentam o fato.
 

É O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA*

COMEÇA SALVAR-SE O PATRIMÔNIO CULTURAL CAMETAENSE?

Salomão Larêdo escritor e Jornalista
Especial para o Magazine

Não é referência ao livro quase homônimo do escritor colombiano Nobel de Literatura de 1982 , Gabriel Garcia Marques – O amor nos tempos do cólera – e, sim o amor, a consciência cultural e o profissionalismo das técnicas do Sistema Integrado de Museus e Memoriais – SIM – que foram salvar , em Cametá, a imponente e importante tela “Cólera Morbus” - , feita em 1858, por Constantino Pedro da Mota Chaves, retratando a grande epidemia do final do século XIX quase dizimando aquela cidade sob o olhar de seu filho cametaense Ângelo Custódio Corrêa, presidente da Província do Pará que também morreu vitimado pelo cólera contraído em Cametá - que se deteriorava em meio as goteiras no prédio onde por muitos anos funcionou o Museu Histórico da cidade.
Cametá, nesse sentido é quase Macondo - a aldeia do livro “ Cem Anos de Solidão” com que Gabo ganhou o Nobel, em 1982 - , se não se apressar em preservar seu enorme patrimônio histórico e cultural, também lingüístico. Cidade que já foi capital de Belém assiste desaparecer suas primeiras ruas tragadas pelo rio Tocantins, e, se não fosse a competência da equipe do SIM/Secult , liderada por sua diretora Renata Maués que é expert em restauração, estaríamos hoje também sem esse móvel memorial de nossa identidade.
Há alguns dias Renata Maués, diretora do SIM, a diretora do Museu de Arte Sacra de Belém , Zenaide de Paiva e a técnica em conservação e restauro Alcione Ribeiro, às expensas do governo do estado, viajaram até Cametá e durante três dias avaliaram a situação da tela em questão e deram conta da tarefa: salvar aquele patrimônio.
No antigo espaço fétido e impróprio que abrigava o museu,as técnicas começaram o processo de higienização da tela reatando ao chassi que estava se despreendendo. Depois, procederam a retirada da tela da moldura encupizada , fazendo o faciamento na lona para evitar que a policromia se perca.
Tarefa árdua em razão da ausência de suporte material inexistente em Cametá, porém, ao cabo dos três dias, a tela estava bem acondicionada e pronta para ser transportada para novo espaço destinado a abrigar as peças do que poderá ser novamente o Museu Histórico de Cametá.
Presentemente Renata explica que está procurando estabelecer os termos do convênio entre a Secult e a prefeitura Municipal de Cametá para que seja assinado pelo titular da Secult, Edílson Moura e pelo prefeito de Cametá Waldoly Valente, documento de cooperação técnica para que , em primeiro lugar e de forma urgente, seja feito o transporte da tela com todo o cuidado e precaução, de Cametá para o laboratório de restauro da Secult, em Belém.O atual dirigente do MHC, folclorista Manuel Valente, confirmou à Renata Maués que a tela foi finalmente transferida paro espaço do atual museu, o prédio da antiga Câmara, reformado.
A restauração da tela demandará, calcula Renata, entre oito a onze meses a um custo está sendo calculado para orçamento que terá a participação do Governo do Estado e a contrapartida da Prefeitura de Cametá.
É vontade da diretora do SIM - Sistema Integrado de Museu e Memoriais-, que a tela, após restaurada, fique exposta no Museu do Estado do Pará, em Belém durante três meses e depois siga para integrar o acervo pictórico do Museu Histórico de Cametá que deve passar por uma completa readaptação e remodelação em sua estrutura física e administrativa com espaço para tratamento das peças, muitas hoje,conforme se ouve falar, espalhadas em diversos locais de particulares, na cidade, justamente por absoluta falta de espaço condigno para abrigá-las no antigo prédio do museu.
Levantamento e sistematização das peças e de todo acervo será feito e deverá ser publicado catálogo de tudo que foi restaurado. Embora haja notícias de que muito material tenha sido extraviado, os técnicos têm esperança de recuperá-los integrando-os ao patrimônio cultural dos cametaenses.
Muito embora ainda vá ser feito o teste de pigmentação, a tela, para a restauradora Renata Maués, pintada por Constantino Chaves, foi feita a óleo. Informa também que a história do artista pintor e da tela já está sendo levantada. Calcula que em Janeiro de 2010 a tela deverá ser exposta em toda a sua beleza, em Belém.
O museu de Cametá durante muitos anos foi dirigido pelo santeiro, escultor , pesquisador e historiador Raymundo Penafort, homem sério que fez todo o possível para manter funcionando, mesmo sem recursos e sem apoio, o museu. A dedicação e o zelo de Penafort fizeram Cametá ainda ter esse museu. Mas, infelizmente Penafort morreu e o museu – inobstante todo o cuidado das demais direções e funcionários – ficou em situação de indigência devido a total falta de apoio e recursos. O prédio deteriorando e cheio de goteiras, tornava o local insalubre, colocando em permanente risco quem ali trabalhava e as peças carentes de cuidado.
Felizmente após muita pressão – de quem se preocupa com o estado da cultura cametaense - , o poder público destinou espaço mais condizente para abrigar as peças do museu, precisando de orientação que agora o SIM pretende suprir uma vez que é desejo da Secult, proceder acertos para que os museus municipais do Pará façam parte do Sistema e recebam orientação técnica ao seu funcionamento, e, claro, todos, continuarão sendo patrimônio do povo de seus respectivos municípios.
Confesso ao leitor, particularmente, que, como cametaense da Vila do Carmo, escritor e cidadão do mundo, sofri e me indignei muito com a situação do Museu Histórico de Cametá. Faz-se necessário mais responsabilidade e cuidado com o que resta da cultura quatrocentona de Cametá , fundada oficialmente a 24 de dezembro de 1635 , mas já existente pelas mãos dos bravos Camutá desde 1612, portanto, antes mesmo da fundação de Belém e sempre carente de recursos, tendo em seu rico patrimônio, tudo para ser uma cidade que possibilite aos seus moradores o viver dignamente como ser humano através do aproveitamento sócio-econômico de sua grandiosa cultura: o casario antigo, a fala cametauara, as danças, os costumes, tradição, cozinha, a arquitetura, política, nomes ilustres, a história do Pará feita e ali vivida, tudo pode ser explorado economicamente em proveito de todos de uma maneira diferenciada do que costumeiramente faz o consumismo neoliberal mecânico, perverso e sem fruição para os verdadeiros atores e sujeitos de sua vida e do que é seu. O povo cametaense pode fazer isso sacudindo a poeira do atraso a que historicamente se deixou submeter por ainda não ter assumido para aproveitar , a seu favor, sua história, sua identidade, sua identificação e a sua significativa cultura.

*Cólera Morbus – Nome da epidemia que assolou o Norte do Brasil, em 1855, destacando-se, Belém e Cametá, pós revolução social do povo paraense, a Cabanagem - 1835 a 1840 - . Para saber mais,dentre outros, consultar: “Cólera, o flagelo da Belém do Grão Pará, de Jane Felipe Beltrão; Rayol, Domingos Antonio – “ Motins Políticos...” e Salles, Vicente, “Memorial da Cabanagem”.


O texto acima saiu em forma de matéria - adaptada e sintetizada para o espaço do jornal - publicada na capa do caderno MAGAZINE, do jornal O LIBERAL , edição de domingo, 04 de janeiro de 2009, com o seguinte título: Patrimônio dos tempos do cólera”, que se pode ler abaixo, a seguir: